MAUÁ E A
HISTÓRIA BRASILEIRA:
sobre memória e esquecimento – um texto introdutório
Ricardo Timm de Souza
Labor Improbus Omnia Vincit
Divisa do Visconde de Mauá
Como progressista e como
emancipador,
Mauá fez sozinho uma revolução,
tal o rigor com que enfrentou a
economia
dominante do Brasil em 1840,
a ortodoxia imperial, a rotina
agrária.
Gilberto Freyre
I
O
objetivo deste breve texto – que se constitui em semente de trabalho de muito
maior fôlego, a ser empreendido proximamente – não é elaborar mais uma
biografia ou descrição da vida e obra desse personagem sui generis da história
brasileira; o que aqui pretendemos é, ao problematizar algumas questões afeitas
à posição que essa figura ocupa na consciência nacional, sugerir alguns dos
traços da própria formação desta consciência coletiva em termos da dialética de
memória e de esquecimento do que de significativo seu passado lhe legou.
Nossa
motivação é a seguinte: quando historiadores sérios, em livros de história do
Brasil, não acham, ao longo de 300 ou 400 páginas, espaço para referir uma
única vez a qualquer coisa que Mauá tenha feito ou significado para a história
nacional – e não estamos aqui falando de manuais simplificados ou superficiais
–, é momento de aí perceber o sintoma de um grave problema de memória coletiva.
Caracterizemos claramente que não se trata de “personalizar” forças históricas
– não há construção histórica persistente que não seja coletiva –, mas, sim, de
mostrar a perigosa impropriedade que consiste em nivelar por baixo, confundindo
a figura de Mauá com a de algum baronete parasítico e dispensável na
historiografia nacional, como costumava acontecer em alguns compêndios de
história do Brasil há algum tempo atrás. Desse modo, não somos partidários de
algum tipo de historiografia personalística, mas também não podemos, apenas por
que as elites latino-americanas se constituíram e constituem, grosso modo, em
instâncias parasitárias, reacionárias e predadoras dos homens e das terras do
continente, confundir todo e qualquer representante da elite com este espírito
parasitário, reacionário e predador – muito especialmente aquele desviante que,
no limite do progresso das idéias econômicas de seu tempo em termos de
empreendedorismo e inovação financeira e industrial em nível mundial – um
liberal no tempo em que a consciência média de produção de riqueza estava
ligada ao aumento da exploração do trabalho escravo – nem por isso mobiliza sua
capacidade para exaurir a seiva da terra e do seu futuro: algo extremamente
raro em termos brasileiros, hoje e sempre, no que tange à relação dos poderosos
com os que, de algum modo, lhes são subalternos.
II
Assim, não é nosso objetivo meramente
louvar a ousadia dessa figura que empreendeu, com verba particular – em uma
época em que o ideal das elites econômicas era, como já ressaltamos, a produção
rural pela exploração do trabalho escravo – as bases da siderurgia nacional, a
criação da primeira viação férrea do Brasil, da companhia de navegação do
Amazonas, da iluminação pública do Rio de Janeiro, o financiamento do sistema
de bondes de Paris e Bruxelas, o estabelecimento da comunicação telegráfica por
cabo submarino entre o Brasil e a Europa, um verdadeiro proto-Mercosul de
informações e comércio, que foi co-elaborador do Código Comercial Brasileiro, fundador
do segundo Banco do Brasil, alguém “de cuja mesa saíam ordens para os diretores
de dezessete empresas instaladas em seis países e informações para um complexo
grupo de sócios, no qual despontavam milionários ingleses, nobres franceses,
especuladores norte-americanos, comerciantes do Pará, fazendeiros do Rio Grande
do Sul”, mantendo a contabilidade de todas elas atualizada em sua memória
prodigiosa[1];
que, no auge de sua atividade, geria “bancos no Brasil, Uruguai, Argentina, Estados
Unidos, Inglaterra e França; estaleiros no Brasil e no Uruguai; três estradas
de ferro no interior do Brasil; a maior fábrica do país, uma fundição que
ocupava setecentos operários; uma grande companhia de navegação; empresas de
comércio exterior; mineradoras, usinas de gás; fazendas de criação de gado;
fábricas variadas”[2]; que
“todas as noites, além de administrar esse império... ainda movimentava sua
fortuna pessoal, aplicada nos melhores títulos financeiros do planeta”[3];
que, “quando resolveu, em 1867, reunir a maior parte das empresas num único
conglomerado, o valor total dos ativos chegou aos 115 mil contos de réis. Só
havia um número no país comparável a este: o orçamento do Império, com 97 mil
contos de réis naquele mesmo ano”[4] –
o que equivalia a cerca de 12 milhões de
libras à época, ou seja, mais de um quarto do ativo da maior e mais sólida
instituição financeira do mundo de então, o Banco da Inglaterra[5]; e
que, last but not least, inspirou
Jules Verne em alguns de seus personagens icônicos e desbravadores e mecenas de
aventuras impossíveis.
Por mais exóticos e notáveis que
sejam, não são esses fatos o centro de nossas atenções nesse momento, nem ao
menos sua falência e reabilitação em termos inusitados, totalmente atípicos,
por sua proverbial idoneidade, em relação seja à sua, seja à nossa época, ou o
conjunto de suas idéias e ações que, em 1850, poderia ser considerado muito
mais “moderno” do que o consenso brasileiro médio de hoje, em muitos meios.
A
questão é: será para alguns historiadores essa extrema raridade sinônimo de
inexistência ou impossibilidade? Ou, o que constitui a tese que aqui
defendemos, é exatamente essa rara existência que, por sua diferença, constitui
a única possibilidade de alternativa de futuro, a distinção precisa e cabal
entre o ordinário e o extraordinário, entre o já estatuído que se cristaliza numa memória coletiva perigosamente inconsciente e o novo que desinstala o próprio habitus
mental interpretativo dos sentidos e das significações?
* * *
Destacamos
que o presente estudo não tem evidentemente cunho estritamente histórico, mas,
antes, tonalidades histórico-filosóficas. Nesse sentido, merece explicação a
lógica de utilização de fontes. Além de nosso acervo particular – que não será
aqui, a rigor, detalhado, pois ainda em catalogação, e que serviu
essencialmente para dirimir dúvidas no que diz respeito a certos temas pontuais
e, principalmente, ilustrar assertivas, sem se constituir absolutamente em
fonte primária –, utilizaremos duas obras principais, de épocas diferentes, que
evitam tanto a laudatória de admiradores fascinados pela figura deste gênio
financeiro, quanto a leviandade de detratores igualmente passionais. Tratam-se
de Mauá e seu tempo, de Lídia
Besouchet, em sua edição de 1978, e da mais recente e conhecida biografia do
autor: Mauá, empresário do Império,
de Jorge Caldeira, livro, em suas linhas gerais, de inúmeros méritos e cuidadosa
feitura, fruto de árduo esforço de um excelente pesquisador.
III
Em nosso livro O Brasil filosófico – história e sentidos[6]
avançamos quatro teses que, a nosso ver, permitem uma aproximação compreensiva
da constituição sócio-histórica do Brasil-colônia, o mundo que, de certo modo,
persiste em suas linhas gerais no tempo de Mauá (e, não obstante a complexidade
da contemporaneidade brasileira, explica ou é encontrável, de forma difusa ou
concentrada, ainda hoje). Cumpre aqui, muito embora nosso interesse nesse
momento seja muito diverso, resgatá-las em seu teor essencial e comentá-las,
pois se constituem, em nosso entender, na chave de compreensão da questão após
exposta, e indiciam os constitutivos principais do mundo contra o qual Mauá
lutará:
a) Antes de mais, não bastam
leituras meramente descritivas de panoramas histórico-culturais amplos e
complexos como o brasileiro; é necessário que se estabeleça uma leitura
claramente “axiológica” do que historicamente se constituiu e historicamente se
legitimou: a idéia de transplantar ou implantar a cultura européia em seu especial
matiz conservador português para as novas terras, determinante para a Colônia
como para o Império, se baseia evidentemente na consideração anterior de que
tal cultura, assim como se apresentava nesses momentos relativamente iniciais
da modernidade, oferecia o que de melhor a civilização greco-romana havia
gestado. Nesse sentido, uma leitura axiológica é igualmente uma leitura arqueológica.
b) Em segundo lugar, é necessário
que se situe com razoável precisão a posição de Portugal no concerto europeu da
época do Brasil-colônia, que, igualmente, se desdobra ao longo do primeiro e do
segundo Impérios, pelo menos. Em meio às tempestades da modernidade nascente, o
país permanece, em termos gerais, fortemente afeito a idéias conservadoras de
um passado em inelutável decadência, ainda que de forma algo mais mitigada em
relação à Espanha contra-reformista. Ressaltemos aqui apenas um exemplo de tal
mentalidade: a perseguição e expulsão dos judeus e de muitos dos assim chamados
cristãos-novos, os quais se estabelecerão, com seus conhecimentos e posses, em
locais de maior tolerância e estímulo a seus empreendimentos – Amsterdã, etc. –
é um exemplo eloqüente desta opção cultural e parece marcar também a opção
definitiva pela permanência em uma estrutura de mundo que conservava da Idade
Média exatamente seus elementos mais rígidos e menos frutíferos. É nesse
contexto que surge a colônia brasileira, que deveria, em boa medida, vir a
sustentar economicamente essa opção. Isto também explica o caráter destacado
por tantos historiadores, que vêem, na forma de chegada e posse dos
portugueses, um “caráter acentuado de ‘feitoria’, muito mais que colonização”[7]. E uma estrutura de feitoria que reproduz com
grande fidelidade as matrizes intelectuais que imperavam na metrópole.
Lembremos apenas, a título de ilustração, que a Mesa Censória de Pombal, após a
expulsão dos jesuítas, vem, por exemplo, condenar Descartes, não por
deficiências de seu pensamento, mas pela prosaica razão de que, no que tange a
tal estilo especulativo, tal seria impróprio para os leitores, “porquanto o
povo português ainda não está acostumado a ler no seu próprio idioma este
gênero de escritos”[8]: pensar
é perigoso.
c) Em terceiro lugar, uma leitura
em termos de facticidade histórica em termos genéticos: foi a partir
destes modelos de implantação que a colonização européia e, por conseqüência,
as diversas interações com culturas autóctones ou estrangeiras efetivamente
se deu – desde o ponto de vista lingüístico, étnico e das mais variadas
produções materiais e culturais subseqüentes, o Brasil atual não é
compreensível senão desde esse processo de transplantação tal como
concretamente se estabeleceu ao longo do tempo, ou seja, em interação com
outros moldes culturais já existentes ou que aqui vieram aportar, como as
diversas culturas africanas, por exemplo – interação essa, não obstante,
mitigada pelo prévio estabelecimento axiológico do validável e do não-validável
no horizonte estreito que se pretende. É apenas desde esta clara parametrização
histórica que o Brasil é minimamente compreensível, e não desde parâmetros
invariáveis quaisquer.
d) E, em quarto lugar, uma leitura histórico-cultural
contemporânea que caracteriza
uma tensão cultural e sócio-histórica ex
origine e que permanece ao longo de toda a história do Brasil; uma
tensão que, reproduzindo em escala própria as grandes tensões da cultura
ocidental, apresenta, todavia, facetas bem particulares, que permitem sua
análise, até certo ponto, em separado, a qual aqui não desenvolveremos,
remetendo ao nosso livro citado.
Como exemplo privilegiado do acima
exposto, veja-se que os livros aqui chegados à época da Colônia passavam,
todos, pelo crivo dos censores: “...as caixas de livros, vindas da Europa,
sempre eram examinadas para o devido crivo. Havia, ainda, uma seleção de
leituras. Não se davam a ler a todos, indistintamente, à proporção que iam
chegando. Estava determinado que se examinassem antes (e corrigissem) no que
tivessem contrário à ‘edificação’ e aos ‘bons costumes’”[9]. Tal fervor censório estendia-se, porém, muito
além da preocupação pela pureza doutrinal, abrangendo todo e qualquer tipo de
obra impressa, incluindo, por exemplo, livros educativos de toda ordem e
clássicos romanos: “...a fiscalização não caía apenas sobre as obras heréticas,
ou supostas tais, pois até os livros poéticos sofriam a censura pedagógica
colegial. Como havia distinção entre os livros escritos em latim e aqueles que
apareciam ‘em romance’, a estes era imposto todo o rigor da mesa censória.
Essas medidas era tomada, ao ver de Serafim Leite, ‘pelos devaneios que
suscitam em cabeças juvenis’ (sic). Desta forma, podia a Congregação da Bahia,
em 1583, propor, à imitação da romana, e sob os aplausos gerais, ‘que se desse
alguma emenda (sic) aos escritos de Humanidades de Plauto, Terêncio, Horácio,
Marcial e Ovídio’”[10].
Na
verdade, portanto, não se tratava de algum mero zelo evangelizador; o que se
trata, isso sim, é de limitar a
qualquer custo o pensamento, a partir do estabelecimento de limites muito estreitos
e controláveis onde este deveria se mover. Tal limitação intelectual
cuidadosamente cultivada, tal atração pelo mesquinho, deveria, à altura dos
estudos superiores, preparar o “apego ao dogma e à autoridade”[11], que deveriam por sua vez caracterizar os eruditos
e cabeças pensantes da colônia. Dadas estas circunstâncias históricas – que
também devem, naturalmente, ser lidas à luz de seu significado em seu tempo –
não é de admirar que o livro pretensamente mais lido no Brasil do século XVIII
levasse o pomposo e sugestivo título de Peregrino
da América, em que se tratam vários discursos espirituais e morais com várias
advertências e documentos contra os abusos que se acham introduzidos pela
malícia diabólica no Estado do Brasil, de autoria de Nuno Marques Pereira
(1652-1728)[12].
Este
foi, então, o modelo cultural profundamente enraizado no Brasil-colônia e
posteriormente e que de forma alguma se pode reduzir apenas ao modo de como os
jesuítas, ou outra ordem religiosa, pensavam em favorecer a preservação e incentivo
da fé cristã segundo a entendiam. É necessário que se entenda que se trata de
uma matriz de controle intelectual e
não de algum episódio meramente incidental, que tende a se reproduzir
continuamente e que deixa suas marcas claras ao longo de toda a história
brasileira, justificando intelectualmente em épocas variadas – e, em muitas
circunstâncias, na contemporaneidade – todo tipo de desmandos e arbitrariedades,
e favorecendo aquele que consideramos o mais funesto e penoso dos vícios
intelectuais: a subserviência do pensamento a serviço do conservadorismo
estéril e da violência dele advinda[13].
É
na herança imediata do mundo estreito acima descrito que surge a figura de Mauá[14]. Poder-se-ia,
aliás, dizer sem receio que tudo o que empreendeu, a somatória infindável de
conquistas, aventuras e desventuras que constituiu sua vida, pode ser lida como
uma vigorosa contrapartida àquele
estado de coisas. A figura empreendedora de longe a mais potente do império
configurou-se, como existência, não só em uma resistência à tentação do
conservadorismo e do imobilismo, mas como uma reação viva a essas seduções que
acometiam os poderosos de então.
Destaque-se, todavia, que tal
reação nada teve de sobre-humano. É um homem apenas que, embora já houvesse
adquirido “na primavera da vida, por meio de infatigável e honesto labor, uma
fortuna que (me) assegurava a mais completa independência”[15],
assume, em sua sinceridade extremada, que “travou-se em meu espírito, nesse
momento, uma luta vivaz entre o egoísmo, que em maior ou menor dose habita o
coração humano, e as idéias generosas que em grau elevado me arrastavam a
outros destinos...”[16].
O desviante e paradoxal em sua
existência foi o fato de que, apesar de todas as tentações, que pelo quinhão de
fortuna que lhe cabia, o maior de todos daquele estilo e justamente por isso o
mais tentador, houvesse enveredado pelos caminhos da ousadia idealista,
abandonando sua confortabilíssima posição, envolvendo-se em todo tipo de
empreendimento, por mais arriscado que pudesse parecer a olhos sensatos:
Numa carta a Reynell de Castro, seu
interlocutor preferido nesses assuntos, ele foi claro a respeito de suas
pretensões: “Quero construir um império que dure séculos”. E disse com toda
clareza o que isso significava: reorganizar completamente seus negócios em
torno de uma grande empresa que “levantasse dinheiro na taxa mais baixa do
mercado londrino para investir aqui (na América do Sul) em títulos de alta
segurança que paguem 2% a 5% mais que as taxas praticadas na Europa”. Essa
empresa seria um grande banco de investimentos multinacional – se os termos já
tivessem sido inventados. Outra vez Mauá se adiantava ao tempo.[17]
IV
Os que me julgaram ferido de morte enganaram-se...
trata-se de restaurar o nome que
para mim vale cem mil vezes mais que os bens
de fortuna.
Visconde de Mauá
A
faceta extraordinária da vida de Mauá... é essa enorme desproporção entre suas
iniciativas particulares e as do Estado brasileiro. (...) Ele
assumia a direção dos planos e o Estado brasileiro aparecia à sua sombra, a fim
de fazer-lhe concorrência... Foi assim na questão do Amazonas, foi assim na
criação do segundo Banco do Brasil, fundado por ele, e que terminou ficando com
o monopólio das emissões, enquanto Mauá possuía sua própria rede bancária...
Lídia Besouchet[18]
Assim,
que a história e os historiadores não se iludam: confundir Mauá com algum barão
parasítico devido a vetustas evocações de títulos de nobreza não induz apenas a
erros de avaliação do significado do que se trata, mas até mesmo a desvios da
possibilidade de aprofundamento da compreensão do mundo no qual viveu e no qual ainda vivemos. Do título, apenas
a divisa, que não poderia ser outra – Labor
improbus omnia vincit – o trabalho tenaz tudo vence – é o verdadeiro
sentido do que se transmite. Numa comunidade cultural marcada pelas interdições
explícitas às ousadias em todos os níveis, ainda que modestas – do pensamento e
da ação – nada pode ser mais subversivo do que isso. Esta figura sui generis, solitária,
desenraizada em inúmeros sentidos, enraizada, em fim de contas, apenas em si
mesma, na sua própria autoconfiança e capacidade empreendedora, não poderia
senão, de algum modo, sucumbir às invectivas de uma época excessivamente
medíocre para ao menos entender de forma consciente o que se passava, a estranha
anacronia que havia, por seu aparecer
no centro nevrálgico de decisão, tumultuado as águas plácidas do quietismo e da
violência surda do sistema escravocrata e da base ideológica que a legitimava. O
movente da história se anunciava e se retraía, na figura estranha desse liberal
desencontrado de todas as significações de domínio público do mundo de então,
realmente compreendido por não mais que meia dúzia de amigos fiéis. É, em suma,
todo um espírito desencontrado de um
universo de significação que aí está presente. O resultado de sua vida não
poderia ser outro: a incompreensão geral e um sofrimento atroz no fim de sua
vida[19]. A
sobrevivência da família por várias gerações já estava, em princípio, mais que garantida
pelo legado de seu filho mais velho Henrique – a ele, bastavam um nome limpo e
uma sepultura decente – “bastam-me nove palmos de terra quando Deus quiser”[20].
Incompreensão geral e sofrimento atroz, mas nunca derrota; em 7 de setembro de 1879 – no meio da tempestade –,
escreve Mauá a seu genro e amigo Ricardo Ribeiro:
...concluo meus preparativos de viagem para a
Europa no mez que vem, para estabelecer em Londres a nova firma de meu filho
Henrique em 1. de janeiro (...) Tenho certeza de dar inteira satisfação aos
interesses que me foram confiados e acredito que em poucos annos de trabalho que me restão lançarei bases
fundas e firmes de operações que meus filhos poderão colocar bem alto se tiverem capacidade (...)[21].
* * *
Sintetizemos,
portanto, as idéias atrás sugeridas. Um universo cultural de referências que
fazia profissão de fé na esterilização, já no nascedouro, de tudo aquilo que
poderia significar a alteração dos jogos de poder em vigência, a pertinácia
persecutória ao questionamento e ao pensamento tout court e à ação dele derivada – o que acima denominamos “a
subserviência do pensamento a serviço do conservadorismo estéril e da violência
dele advinda”, tem agora no mundo financeiro e industrial, como já tivera e
tinha, em outras oportunidades, no mundo literário e filosófico[22],
uma figura capaz de realmente ameaçar suas bases. Não podia ser enfrentado
diretamente, mas podia – e foi – corroído em suas bases de sustentação pelo
reacionarismo obstinado. Um episódio apenas – a iluminação a gás do Rio de
Janeiro, por ele empreendida – bem ilustra a lógica dessa corrosão. Quando da
inauguração desse empreendimento, que havia mobilizado muito favoravelmente a
opinião pública, logo surge a insidiosa e anônima reação:
Todos os jornais da capital, à exceção talvez
do Monarchista, que único soube ser
justo, atribuíam ao senhor Irineu as vantagens de ser hoje esta cidade
iluminada a gás. Nós, porém, sem que nos cansemos com o senhor Irineu, que
decididamente não passou de instrumento, e instrumento guiado pelo móvel do
interesse pessoal, consignaremos em nossas colunas algumas linhas do verdadeiro
mérito. (...) É do gabinete de 29 de setembro, é ao ilustre ministro da Justiça
de então, o sr. Conselheiro Eusébio de Queirós, a quem se deve a execução desta
bela idéia e não ao sr. Irineu a quem, se deve alguma cousa, é por falta de
execução do contrato, pelo qual se obrigava a que cada bico de gás desse uma
luz mais forte que a de Londres, entretanto que ninguém haverá que já tenha
estado na capital da Inglaterra, que não conheça que nossos bicos de gás em vez
de darem uma luz mais forte dão uma sensivelmente mais fraca. (...) Ao zelo
administrativo e a probidade do sr. Eusébio é que portanto se deve unicamente
este melhoramento. Esforçar-nos-emos sempre em render as idéias e culto que
elas merecem, e por isso não podemos tolerar que se defraude o verdadeiro
merecimento, o verdadeiro zelo pelo progresso e interesse público, em favor da
especulação. (...) O sr. Conselheiro Eusébio procurando iluminar a cidade a gás
teve em vista unicamente o melhoramento deste ramo, o progresso e o bem
público, o sr. Irineu nada mais mirou que à especulação, do que ao interesse
individual[23]
A
tentativa patética de atribuir à ganância as atitudes de quem disso não apenas
não necessitava – era já imensamente rico –, mas lhe era totalmente estranho,
bem mostra o calibre intelectual e moral dos autores – os quais, porém,
reproduziam fielmente a lógica de funcionamento da reação. Só a espíritos
extremadamente mesquinhos e movidos por interesses mais que obscuros poderia
ocorrer um argumento por sua vez tão mesquinho. Pois a figura de Mauá – e isso
já era mais que notório à época, até mesmo entre seus mais ferrenhos inimigos
–, assemelhava-se a um extravagante perdulário e não a um ganancioso:
Pessoalmente, todos os dados biográficos
coincidem em que Mauá não amava o dinheiro, e sim a ação. Não estava
preso à vida de homem rico e sim aos vultosos empreendimentos que podia
realizar. O dinheiro não era para ele um fim, mas um meio. Em inúmeras ocasiões
deu prova de desinteresse. Certa vez, devolveu a uma companhia inglesa dez mil
libras, dizendo: ‘Não fiz nada. O advogado fez tudo’. Distribuiu entre os
empregados de sua primeira estrada de ferro cerca de 200:000$000 pela
contribuição por eles prestada. Apadrinhou, indenizou e alforriou centenas de
escravos. Saldou sempre as perdas de suas companhias sozinho, sem que seus
sócios perdessem um vintém. Tal foi o caso da Estrada de Ferro da Tijuca, em
que perdoou ao engenheiro Thomas Cochrane uma dívida de 200:000$000; tal
sucedeu com a Companhia de Diques Flutuantes, que por estudos mal feitos deu
prejuízo e ele indenizou os sócios; e tal sucedeu com a São Paulo Railway, que
pela largueza dos adiantamentos aos empreiteiros foi talvez uma das causas
imediatas de sua falência (...) Seu nome figura em todas as tômbolas, loterias,
listas de beneficências, muitas vezes até anonimamente, como durante a seca da
Bahia, em que doou importância superior à do próprio Imperador. Era
administrador e benemérito da Santa Casa de Misericórdia, tesoureiro de todas
as comissões criadas na época para auxílio das vítimas da Guerra do Paraguai,
da epidemia de cólera, etc.”[24].
Podemos, assim, chegar à raiz da
questão: podemos imaginar o quão irritante e ameaçadora terá sido para as elites escravocratas da época o
banquete de inauguração do gasômetro do Rio de Janeiro; de fato, nessa ocasião
Mauá ofereceu um banquete ao ar livre para oitocentas pessoas, no qual tomaram
assento contíguo toda ordem e grau de trabalhadores, dos engenheiros-chefes aos
últimos dos empregados... – irritante e ameaçadora a ponto de evocarem, na
falta de argumento melhor, no citado artigo jornalístico, a figura de um
anti-escravagista notável, o ministro Eusébio de Queirós, como verdadeiro
responsável pelo empreendimento, como se
isso fosse, de algum modo, descontentar seu bom amigo Irineu, que tanto o
admirava!
Enquanto
os proprietários lamentavam a falta de escravos e conspiravam contra leis
atenuantes da ignomínia escravocrata, como a própria Lei Eusébio de Queirós de
1850, Mauá implementava administrações participativas e distribuição de lucros
para empregados... abstraído o paradoxo epocal desses acontecimentos
perfeitamente concomitantes, o que poderia ser mais perigoso do que isso?
* * *
Ordinário versus extraordinário, ou, pela ordem dos fatores, extraordinário versus ordinário: essa parece ser a
verdadeira luta civilizatória que se trava, mesmo após a falência de muitos dos
sentidos da palavra “civilização”. A um país, muitos crimes serão perdoados;
dificilmente serão perdoados, porém, os crimes do esquecimento e da opressão –
esquecimento da opressão dos fracos, vítimas benjaminianas da história dos
vencedores, e esquecimento daqueles cuja vida não se constituiu, ao fim e ao
cabo, senão em crítica radical das lógicas ordinárias, satisfeitas,
totalizantes, secularmente bem-assentadas e legitimadoras de opressão. Que se
pode esperar de um país que esquece as encruzilhadas históricas que atravessou
quando seu destino foi decidido, ao menos para aprender com as hesitações e
descalabros da história? Que não seja este o nosso caso. Que Mauá não seja
esquecido: essa é uma das condições para que o Brasil encontre finalmente a si
mesmo e ao seu destino humano.
Porto Alegre, novembro de 2007.
Referências
ACERVO particular de cartas e documentos não catalogados de Mauá e
descendentes, de Ricardo e Maria Alice Timm de Souza.
BESOUCHET, Lídia. Mauá e seu tempo,
Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1978.
CALDEIRA, Jorge. Mauá – empresário
do Império, São Paulo: Companhia das Letras, 1995.
FARIA, Alberto de. Mauá, São
Paulo: Companhia Editora Nacional, 1958.
INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO BRASILEIRO, O Visconde de Mauá (no cincoentenário de seu falecimento), Rio de
Janeiro, Imprensa nacional, 1940.
MAUÁ, Visconde de. Autobiografia
– “Exposição aos credores e ao público” seguida de “O meio circulante do
Brasil”, Rio de Janeiro: Livraria editora Zelio Valverde, 1943 (segunda Edição,
de 165 exemplares, prefaciada e anotada por Cláudio Ganns, acompanhada de
indicações genealógicas, históricas e bibliográficas e de 30 gravuras fora do
texto).
SOUZA, Ricardo Timm de. O Brasil
filosófico – história e sentidos, São Paulo: Perspectiva, 2003.
[1] CALDEIRA, Jorge. Mauá – empresário do Império, São Paulo:
Companhia das Letras, 1995, p. 17.
[2] Idem, p. 17.
[3] Idem, p. 17.
[4] Idem, p. 17.
[5] Idem, p. 32. O montante dos bens de Mauá, em seu
momento máximo, equivaleria hoje em moeda atualizada a aproximadamente 60 bilhões
de dólares.
[6] SOUZA, Ricardo Timm de. O Brasil filosófico – história e sentidos,
São Paulo: Perspectiva, 2003.
[7] VITA, L. W., Panorama da filosofia no Brasil, apud
SOUZA, Ricardo Timm de. O Brasil
filosófico, p. 30.
[8] VITA, L. W. apud SOUZA,
Ricardo Timm de. O Brasil filosófico, p.
30.
[9] VITA, L. W., apud SOUZA,
Ricardo Timm de. O Brasil filosófico,
p. 36.
[10] VITA, L. W., apud SOUZA,
Ricardo Timm de. O Brasil filosófico,
p. 36-37.
[11] VITA, L. W., apud SOUZA, Ricardo
Timm de. O Brasil filosófico, p. 37.
[12] VITA, L. W., apud SOUZA,
Ricardo Timm de. O Brasil filosófico,
p. 37.
[13] É evidente
que, não obstante sua intensidade e pertinácia, tal modelo não conseguiu – e
nunca conseguiria – esterilizar os espíritos. Terão havido certamente
incontáveis exemplos de inquietude intelectual, a imensa maioria infelizmente
submersa no roldão da “história oficial” e ainda aguardando sua devida
valorização, caso seja ainda possível detectá-los; alguns porém permanecem, ou
são reencontrados contemporaneamente por uma releitura mais lúcida dos fatos
históricos, como legítimos representantes de uma inteligência vigorosa que se
manifesta em meios extremamente árduos e testemunha ao futuro sua grandeza.
Citemos apenas, a título de exemplo, para a época da colônia, duas figuras
dessa estirpe: o padre Antônio Vieira com suas Cartas e seus Sermões e Luiz Antônio Verney, o
“Barbadinho”, com seu interesse pela modernidade e sua célebre obra Verdadeiro método de estudar. Cf. SOUZA,
Ricardo Timm de. O Brasil filosófico,
passim.
[14] Não entraremos aqui em
questões biográficas ou dados históricos. Para generalidades biográficas, cf. a
obra cit. de L. Besouchet; para sua formação e detalhes de suas atividades como
comerciante, industrial, banqueiro e político, cf. a obra cit. de J. Caldeira.
[15] MAUÁ, Visconde de. Autobiografia – “Exposição aos credores
e ao público” seguida de “O meio circulante do Brasil”, Rio de Janeiro:
Livraria Editora Zelio Valverde, 1943, p. 95 – é a primeira frase da Autobiografia.
[16] MAUÁ, Visconde de. Autobiografia – Op. cit., p. 96.
[17] CALDEIRA, Jorge, op. cit.,
p. 417.
[18] Op. cit., p. 73.
[19] Tentando consolar seu
sobrinho Ricardo Daisson de Souza da perda de um filho de 17 anos de idade,
escreve-lhe sua filha Irene em carta de 10 de julho de 1931: “...procure reler
a biographia de seu avô... Só fala da sua (de Mauá) vida publica, é verdade,
mas seus sofrimentos foram enormes... Os desgostos de família ainda foram
maiores e elle sofreu-os todos com a maior resignação e coragem...” (ACERVO
particular de cartas e documentos não catalogados de Mauá e descendentes, de
Ricardo e Maria Alice Timm de Souza).
[20] É
importante que se note, como bem ressalta Lídia Besouchet, que a falência de
Mauá lhe chegava “não pela ruína de seus negócios, mas por uma injusta
aplicação da justiça” (Op. cit., p. 171); a saber: “...o Tribunal Superior de
Justiça julgou seu recurso contra a decisão do tribunal paulista e deu sua
sentença sobre a Santos-Jundiaí. Oito anos depois de sua primeira decisão
favorável, os juízes examinavam de novo a mesmíssima questão que já haviam
decidido em 1869 – poderia a causa ser julgada no Brasil? – e chegavam a uma
conclusão oposta à primeira. Por unanimidade, deram ganho de causa à
ferrovia...” (CALDEIRA, Jorge, Op. cit., p. 520). Saliente-se que “Mauá era
imensamente rico e muitos de seus bens e propriedades estavam fora do
território nacional e podiam facilmente escapar ao controle judicial. Sequer
pensou nessa hipótese. A quitação dos credores que haviam depositado nele toda
confiança tornou-se quase uma obsessão. ‘Só deixarão de ser pagos até o último
minuto da última hora do último pagamento que se deve, se, empenhando a camisa
do corpo, o chapéu e as botas de montar, isso não se puder conseguir’, declara
com obstinado orgulho” (BESOUCHET, Lídia, Op. cit., p. 171). “Colhido na
armadilha das leis, dos prazos jurídicos, das legislações defeituosas, das
chicanas de advogados administrativos que pululavam na época, Mauá só tem em
mente indenizar seus credores, pagar a todos aqueles que confiaram na palavra
dada, salvar sua reputação, seu nome, sua honra comercial” (BESOUCHET, L., Op.
cit., p. 175). Por outro lado, a morte o colheu reabilitado moralmente, porém
esgotado física e espiritualmente: “...fomos hontem desagradavelmente
surpreendidos pela notícia do falecimento de nosso Sogro (...) sirva-nos de
lenitivo nos lembrarmos em tão triste era a vida que elle levava; taes erão
seus sofrimentos que elle mesmo mil vezes preferia morrer (carta de 22 de
outubro de 1889 de Tito Ribeiro, filho de Ricardo J. Ribeiro, gerente do banco
Mauá e genro de Mauá, à sua cunhada Amélia Daisson - ACERVO particular de
cartas e documentos não catalogados de Mauá e descendentes, de Ricardo e Maria
Alice Timm de Souza).
[21] Carta de Mauá a Ricardo Ribeiro,
7 de setembro de 1879, ACERVO particular de cartas e documentos não catalogados
de Mauá e descendentes, de Ricardo e Maria Alice Timm de Souza. As palavras
grifadas encontram-se sublinhadas no original um hábito recorrente de Mauá em
sua escrita, dando testemunho de uma escrita enfática e pouco protocolar.
[22] Cf. SOUZA, Ricardo Timm de. O Brasil filosófico – história e sentidos.
[23] Jornal Ilustração Brasileira, apud CALDEIRA, Jorge, Op. cit., p. 290.
Lembremos, por outro lado, que Eusébio de Queirós foi bom amigo de Mauá; cf.
BESOUCHET, Lídia, Op. cit., p. 61: “Seus laços de amizade com Eusébio de
Queirós e outros abolicionistas destacados demonstram a ligação estreita que
sempre manteve com os elementos anti-escravagistas. Numa época em que o
preconceito contra o escravo era ainda muito forte, Mauá firmava contratos com
seus fornecedores europeus estipulando em determinadas cláusulas ‘não empregar
o braço escravo’”. A sua coerência se expressa nesse testemunho pessoal de
Gabriel Terra, presidente do Uruguai: “Fui testemunha de uma cena que me ficou
gravada no espírito, tão certo é que se fixam com intensidade as fortes
impressões da infância. Como criado de minha casa, havia um negro, um dos
muitos que Mauá libertara antes da abolição da escravatura, que, ao ver chegar
seu benfeitor, correu para ele e, curvando-se, quis beijar-lhe a mão. Bem me
recordo a rapidez com que se evitou esse gesto humilhante e deprimente,
levantando Mauá em seus robustos braços aquele que continuara sendo escravo
pelo impulso do atavismo, para abraçá-lo de igual para igual, até que o negro
inclinou a cabeça sobre seu ombro e chorou convulsivamente. Tive a intuição do
que significava aquela cena, cujo verdadeiro alcance compreendi somente depois,
ao continuar o caminho de minha existência”. (Cit. por Gustavo Barroso, em
Conferência realizada no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro em 23 de
outubro de 1939, in: INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO BRASILEIRO, O Visconde de Mauá (no cincoentenário de seu
falecimento), Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, 1940, p. 62). Ainda:
“desde 1838 (aos 25 anos de idade, R. T. S.) ganhou a má vontade dos senhores
de escravos com a fama de bandeira de
misericórdia que lançaram ao apadrinhador de negros fugidos na mata do
Curvelo; em 1850, como um grande auxiliar de Eusébio de Queirós na repressão do
contrabando de carne humana; e daí por diante, nas suas manifestações
expansivas de pensamento e nos atos de liberalidade de inúmeras alforrias de
escravos. Suas objurgatórias contra a propriedade
maldita, a exploração do homem, a
nefanda escravidão, são acompanhadas
de uma propaganda tenaz desde 1853 pela imigração branca que deveria substituir
o braço escravo; fundou em 1855, no Amazonas, uma colônia de 600 açorianos e em
1857 outra de 500 algarvianos e em 1872 estabeleceu nas suas fazendas de
Atalaia em Macaé 200 hindus vindos à sua custa das ilhas Maurício, e 100 na sua
fazenda de Sapopemba, a poucos quilômetros da capital” (FARIA, Alberto de. Mauá, p. 90-91; também em BESOUCHET, L.,
Op. cit., p. 60-61 – ressalte-se que as fazendas de Sapopemba e Atalaia foram
as primeiras a utilizar arados mecânicos no Brasil).
[24] BESOUCHET, Lídia. Op. cit.,
p. 165-166.